sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Economia Paralela em Portugal

O conceito de economia paralela é frequentemente associado aos países menos desenvolvidos, onde persistem sistemas fiscais que têm pouco controlo nas actividades económicas desenvolvidas no seu país. Porém ao contrário do que seria expectável, segundo estudos recentes realizados pelo professor austríaco Friedrich Schneider, na Europa são países como a Grécia, Itália, Espanha e Portugal que lideram a tabela dos países com maior percentagem de economia paralela. A Grécia ocupa a primeira posição, sendo que a economia paralela representa 25,2% do seu PIB, seguida da Itália (22,2%) e da Espanha (19,8%). Segundo este mesmo estudo, Portugal ocupa a 4ª posição, sendo que a economia paralela corresponde a 19,7% do PIB oficial, claramente acima da média da OCDE (14%).
No início desta década, a economia paralela em Portugal assistiu a uma regressão de cerca de 4 pontos percentuais (em 1999 encontrava-se perto dos 23% - ilustração através do gráfico 1) que se ficará a dever a um forte crescimento e incentivo da economia oficial. Chegados ao ano de 2008 e ao início da actual crise económica e financeira, a economia paralela retomou o seu crescimento, ultrapassando a barreira dos 20%. Actualmente a economia paralela representa cerca de 33 mil milhões de euros, o que chega a ultrapassar o dobro do maior défice orçamental alguma vez registado em Portugal. Tiago Cavalcanti, professor da Universidade de Cambridge, compara a economia paralela em momentos de crise a um autêntico colchão. Esta afirmação deve-se ao facto de em momentos de crise, o desemprego aumentar e consequentemente existirem mais pessoas a criar os próprios pequenos negócios. Desta forma, os pequenos negócios, contribuem para o aumento das actividades informais e evasão fiscal. Pode considerar-se que a economia paralela é uma compensação da diminuição dos rendimentos obtidos através da economia oficial.




Gráfico 1 – Dimensão da Economia Paralela no período 1999-2003 (Relação entre a Corrupção e a % de economia paralela em relação ao PIB)


Tendo em conta o desenvolvimento nacional, a economia paralela deveria ficar sempre abaixo de 15% do PIB, sendo que acima desta taxa se considera uma prática excessiva de economia paralela. Ambicioso e ideal seria diminuir até níveis idênticos aos dos Estados Unidos da América, que apresentam uma taxa de apenas 10% de economia paralela, em relação ao PIB.
No nosso país os factores que contribuem em grande medida para o aumento da economia paralela são a evasão fiscal, a fraude e também a contrafacção. A responsabilidade do aumento da fraude e da evasão fiscal (gráfico 2 e 3), atribui-se frequentemente às altas taxas de impostos praticadas em Portugal. A acumulação de taxas como IVA, IRC e as demais tributações, levam a que muita da actividade económica realizada em Portugal não seja declarada. Um dos principais problemas na evasão fiscal prende-se com a falta de declaração de produção legal, de modo a diminuir os contributos para a segurança social e o pagamento de IRC. Perante as altíssimas taxas contributivas aplicadas pelo sistema económico às empresas, muitos são os empresários que por esse país fora procuram mecanismos, habitualmente de índole ilegal, para que possam reduzir as suas despesas e contribuições para o Estado. Um dos grandes mecanismos de desvio de dinheiro proveniente da produção é o branqueamento de capitais. Este é um flagelo que afecta a economia em qualquer parte do Mundo, porém aumenta também em momentos de crise económica e financeira. As crises económicas que ao longo dos tempos afectaram o Mundo, estão intimamente relacionadas com o branqueamento de capitais, na medida em que nesta altura devido à diminuição dos rendimentos oficiais, as pessoas encontram outros mecanismos para a aumentarem os seus rendimentos e não podem declarar esses dinheiros de forma oficial, nem cruzá-los nas suas contas bancárias habituais. É contra o branqueamento de capitais, que o Banco de Portugal realiza uma grande acção em parceria com os sistemas de Finanças. O cruzamento de dados é hoje em dia uma das grandes armas contra a economia paralela e o próprio branqueamento de capitais. Quanto à contrafacção, já referida como constituindo uma parte significativa da economia paralela, é importante referir que este tipo de actividade ilícita representa cerca de 7% das trocas mundiais. Enquanto antigamente esta actividade afectava apenas bens de luxo, na actualidade interfere nos mais diversos tipos de bens e indústrias (moedas, notas, têxteis, automóveis, produtos farmacêuticos, alimentação, tabaco, jogos, aparelhos de entretenimento, equipamentos digitais, …). A contrafacção acarreta prejuízos no plano empresarial, já que gera uma grande quebra nas receitas e na produção; no plano do consumidor, pode colocar em perigo a saúde e segurança dos consumidores; e no plano do Estado, é considerada como economia paralela, o que gera perda de receita fiscal, redução de investimento e crescimento económico, aumento do desemprego e clandestinidade. Quanto à contrafacção de notas e moedas existe um dano acrescido, já que todos os bens trocados por dinheiro contrafeito, trazem prejuízo na totalidade ao vendedor, pois o dinheiro recebido tem um valor nulo em relação ao bem produzido.
No dia-a-dia de qualquer cidadão, cada vez mais nos podemos deparar com a pergunta “Quer com factura? Ou sem factura?”. Nestes casos, a consciência moral diria que esta era uma conduta ilegal, e como tal deveria ser denunciada. Mas no que toca à Economia, a consciência moral de pouco vale, já que para tanto o produtor como o consumidor tiram benefício do facto de não declararem aquela transacção, através de uma factura. A verdade é que a economia paralela se passa à frente dos nossos olhos e nós não a queremos ver. Quando é preciso um pequeno “biscato” em casa, chama-se o vizinho ou remenda-se com o que há em casa. Muitas vezes praticamos economia paralela de forma quase involuntária, já que muitas das pequenas actividades diárias praticadas pela população, geram produção que não é de forma alguma tributada.



Gráfico 2 – Impostos detectados em falta entre 2006 e 2008


Gráfico 3 – Impostos detectados em falta, consoante o seu tipo


Desde 1999 que a Comissão Europeia, procura uma resolução para que as actividades ilegais possam ser contabilizadas no PIB. O Sistema Europeu de Contas, inclui nos seus regulamentos a inclusão das actividades legais na medição da riqueza produzida por um país, no entanto nenhum país realiza estimativas explícitas e concretas relativamente a estas actividades. Em 2006, quando a Grécia reviu as suas contas nacionais, querendo nelas incluir as actividades informais e ilegais, esta questão voltou a ganhar forma, já que neste ano a Grécia fez o seu PIB crescer 25%, contas estas que foram validadas pelo Eurostat. Durante o ano de 2009, foram apresentadas várias propostas neste sentido, pelo que em data ainda a definir, algumas actividades ilegais, como a prostituição, o tráfico de droga, o contrabando e o jogo clandestino, vão ser incluídas no Produto Interno Bruto. No entanto, mesmo que estas actividades sejam incluídas no cálculo do PIB, a Contabilidade Nacional continuará a ter lacunas e limitações, já que temos materiais que são vendidos de forma legal, que posteriormente são utilizados para produções ilegais (é o caso do cimento vendido quer para construções legais ou ilegais). Assim, mesmo com a inclusão da economia paralela na riqueza produzida por um país, o seu PIB será sempre alvo de alguma incerteza e terá alguma riqueza repetida e outra por contar.
Por último é necessário ressalvar o combate à economia paralela que é feito pelos governos. Tratando-se de um obstáculo à inovação e competitividade, a economia paralela tem sido combatida nos últimos anos com medidas como a reformulação do financiamento da actividade económica. Assim é sumariamente necessário que o Estado realize acções de fiscalização de empresas nos seus vários domínios (trabalhadores, produção, vendas, compras, lucros,…); reformulação das tributações aplicadas de modo a criar mecanismos de incentivo à actividade económica oficial; e ainda promover o financiamento das actividades económica, de modo a fixar as empresas e desenvolvê-las, combatendo a venda de produção por circuitos paralelos, para que seja possível dinamizar a competitividade e inovação empresarial.

1 comentário:

  1. É por estas e por outras que temos de fazer tudo para erradicar a corrupção e defender a transparência, caso contrário continuamos a marcar passo no desenvolvimento económico e social. Já para não falar que é impossível realizar uma sociedade onde a igualdade de oportunidades seja uma realidade!

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